Piolhinha






Piolhinha


A classe dos pequenos padecia com uma infestação de piolhos. 

Todos os esforços que estavam sendo feitos para resolver o problema pareciam ser em vão. A escola mandava bilhete, os pais tratavam, os piolhentos eram afastados alguns dias e devolvidos sem sequer uma lêndea, mas logo os bichinhos voltavam a atacar sem piedade o couro cabeludo da meninadinha.

A mãe não aguentava mais. Sua filha parecia que tinha néctar para atrair piolho. Era mandar pra escola que voltava coçando a cabeça. 

Resolve tomar uma atitude. Ela era muito boa nisso.

Encontra a professora na porta da sala e, num momento privado, dispara:

- Escuta, não é possível isso que está acontecendo! Com certeza tem um foco, alguma criança que a mãe não está tratando. Quem é?

A professora olha para um lado, olha pro outro e solta num cochicho: 

- A Fulaninha. Você sabe, a mãe dela é supernatural. Tipo super mesmo…não gosta de produtos químicos e se recusa a passar qualquer coisa na cabeça da menina. Dá pena de ver o tanto que ela se coça.

- Pô, mas nem um vinagre com pente fino?! Quer algo mais natureba que isso?

- Nada. Já tentamos de tudo. Ela se recusa, diz que o corpo da menina vai se equilibrar e expulsar o piolho sozinho. O pior é que a pobrezinha tem um cabelo enorme! Impossível não encostar nas outras crianças. A gente até prende, faz um coque, mas não adianta.  Estamos evitando suspendê-la, mas não sabemos mais o que fazer.

Depois de prometer que a conversa ficará entre elas, a mãe se despede e sai matutando um plano. Ela também era muito boa em ter ideias.

Na mesma tarde, liga pra mãe paz e amor e convida a pequena Gal Costa para ir brincar em casa depois da escola. 

Tudo arranjado, ela pega as meninas na saída e, no caminho, dá uma paradinha na farmácia.

Chegando em casa, as meninas brincam um pouco e depois de um lanchinho, a mãe sugere:

- Vocês não querem brincar na banheira? Tenho giz de cera de azulejo e esse canudo de fazer megabolhas de sabão!

As meninas topam e enquanto brincam, a mãe vai espumando o cabelo das duas, delicadamente, com shampoo de piolho. Depois “desembaraça” com pente fino, fazendo esculturas engraçadas e penteados de princesa.

Repete a brincadeira na semana seguinte e na outra, só por precaução.

A infestação de piolhos foi milagrosamente controlada e, para todos os efeitos, o corpo da menina se equilibrou e expulsou sozinho o inimigo. 

Só que não.

Comentários

Diva disse…
Hahaha, essa foi boa!!!
Não sei porque, mas essa mãe cheia de ideias me lembrou você!!!
Viva as boas atitudes!!!
Anônimo disse…
Não achei engraçado não. Ok, a mãe-natureba estava causando um problema pra turma, então a escola que suspendesse a menina. Mas levar a menina pra casa e usar um produto químico na criança, sem nem saber se ela era alérgica me parece total falta de respeito. A professora disse que a mãe não passava o produto por uma ideologia dela (que não cabe julgamento de ninguem), mas e se não fosse esse o motivo? Isso só reforça minha neura em deixar meu filho brincar na casa de coleguinhas. Ele não toma refrigerante, vai que uma mãe super engraçadinha como essa da sua 'história' resolve oferecer só pra provar que não faz mal né? Não achei graça. De verdade.
Lúcia disse…
Ok, se estava prejudicando o coletivo, a escola deveria convocar uma reunião com a mãe natureba e não uma outra mãe invadir o espaço que não é seu com uma atitude dessa. É por isso que tenho medo de deixar meus filhos na casa dos outros.
Anônimo disse…
Nossa, achei o absurdo do absurdo!! Não tem nada no mundo que justifique essa mãe "fictícia" ter usado um produto químico à revelia na menina!!!!!
Anônimo disse…
A intenção da mãe fictícia foi boa mas fez com que a mãe natureba achasse que estava certa, de que o corpo da menina se equilibraria e expulsaria os piolhos. Pra mim, não adiantou nada pq se a menina voltar a ter a mãe tomará a mesma atitude.
Realmente utilizar produto químico na criança que não é sua filha sem saber se é alérgica, é um abuso.
Anônimo disse…
Texto muito bom! E pelo visto um pouco polêmico em relação se a mãe devia ou não interferir na vida de outra criança. Acho que a mãe que lavou a cabeça da menina foi genial, mas um pouco imediatista. Existem regiões do país onde o calor é muito intenso, os piolhos entre a criançada são comuns. As mães matam os bichinhos com "Chapinha" para não ficar colocando muita química na cabeça da criança. Também acho que a mãe natureba quando não tratou sua filha, também invadiu o espaço de outras famílias, afinal, quantas crianças usaram química na tentativa de matar esses bichos infernais? Não tratar do seu filho foi uma forma extremamente irresponsável e egoísta com o resto da comunidade que ela vive. E o sofrimento dessa criança coçando a cabeça? Além da exclusão social que ela vai sofrer no futuro. Se eu estivesse nesta situação, eu pediria para escola chamar um órgão de saúde pública para ajudar a resolver o caso.
Maria Tereza disse…
Sorte desta menina de encontrar uma mãe, mesmo que alheia, que tomasse uma atitude. Sou do tempo que se matava piolhos com neocid e todas as crianças sobreviveram.
Fico pensando nestas mães naturebas em relação às vacinas...
Juba disse…
Condicionador e pente fino resolvia, sem o risco de uma alergia. Tratei duas filhas piolhentas assim, não sobrou nenhum piolho pra contar a história.

Também não gostei da história. Dialogar pra quê, né?
Marcia Soares disse…
Pois eu adorei a história, como tudo que você escreve!!
Li os comentários, todo mundo tem lá sua razão, mesmo assim adorei!!